Morre físico Peter Higgs, premiado por ‘partícula de Deus’ – 09/04/2024 – Ciência

Redação
por Redação


Morreu nesta segunda-feira (8), aos 94 anos, o físico britânico Peter Higgs, um dos responsáveis por uma das mais espetaculares predições teóricas já confirmadas na história da física: a existência de uma partícula que completaria o álbum de figurinhas dessas entidades subatômicas e explicaria como todas as partículas adquirem sua massa.

A informação foi anunciada pela Universidade de Edimburgo, na Escócia, onde ele figurava como professor emérito. “Morreu pacificamente em sua casa na segunda-feira, 8 de abril, depois de uma curta enfermidade”, disse a instituição em nota.

O cientista será lembrado principalmente por causa da partícula que leva seu nome –o bóson de Higgs, que teve sua descoberta anunciada com todo estardalhaço pelo Cern (Organização Europeia para Pesquisa Nuclear) em 2012, tornando o pesquisador famoso em todo o mundo e validando o esforço de construção do LHC (Grande Colisor de Hádrons), maior acelerador de partículas do mundo, a um custos de 10 bilhões de euros.

No ano seguinte, Higgs e François Englert ganhariam juntos o Prêmio Nobel em Física, “pela descoberta teórica de um mecanismo que contribui para nossa contribuição da origem da massa das partículas subatômicas”.

Doutorado em física pelo King’s College de Londres em 1954, o cientista faria sua maior contribuição à ciência em 1964. Já como pesquisador da Universidade de Edimburgo, ele escreveria um artigo publicado no periódico Physics Letters, delineando sua teoria para explicar as massas das partículas. Um segundo artigo, submetido no mesmo ano à revista Physical Review Letters, descreveria o que agora é chamado de “mecanismo de Higgs”, modo pelo qual as partículas adquirem suas massas.

Uma forma simples de explicar a ideia é pensar que o espaço é tomado por um campo que age como uma espécie de arrasto para o movimento de partículas, que então manifestam suas massas de acordo com a intensidade dessa interação. Pense em bolinhas de gude de diversos tamanhos em meio a uma piscina, em que cada uma sente de maneira diferente a resistência de água a seu movimento.

Só que esse campo de Higgs, ao qual corresponde uma partícula específica, diferentemente de uma piscina, com seus limites e fronteiras, estaria em todos os cantos do Universo. Seria onipresente. Por causa disso, o físico americano Leon Lederman apelidaria o bóson de Higgs de “partícula de Deus” –o que daria outro nível de notoriedade ao trabalho de Higgs (que nunca fora religioso, por sinal).

Outros dois grupos de cientistas (a dupla Robert Brout e François Englert e o trio Gerald Guralnik, C. R. Hagen e Tom Kibble) chegaram às mesmas conclusões de forma independente naquele mesmo ano. Os três artigos, por sinal, foram celebrados como grandes marcos pela Physical Review Letters em seu 50º aniversário.

“Há momentos na ciência nos quais uma certa ideia parece pairar no ar e acaba sendo captada por várias pessoas”, diz Sérgio Novaes, físico da Unesp (Universidade Estadual Paulista) associado ao Cern e um dos participantes da descoberta do bóson de Higgs, em 2012. “Foi isso o que ocorreu com o conceito do mecanismo de Higgs. A proposta solucionava um importante problema que envolvia a massa de certas partículas. Apesar de não ter sido o único a conceber esse mecanismo, Peter Higgs foi o primeiro a identificar uma partícula remanescente no modelo: o bóson de Higgs.”

Novaes lembra que a ideia não foi abraçada de imediato pelos cientistas. “Apesar de bastante interessante, o modelo sofreu grande resistência da comunidade científica devido à artificialidade da proposta.”

Também não ajudava que ele não fosse tão facilmente verificável, considerando as incertezas envolvidas na quantidade de energia exigida de um acelerador de partículas para, através de colisões, conjurar por uma fração de segundo a fugidia existência do bóson de Higgs antes que ele pudesse sofrer decaimento e se converter em outras partículas mais leves. Contudo, uma falta de modelos alternativos satisfatórios capazes de explicar a origem das massas das partículas por quase 50 anos acabou fazendo com que a ideia fosse vista com melhores olhos. “Tanto assim que o maior instrumento científico já feito, o LHC, foi construído com a finalidade de investigar o Higgs.”

Em 2012, as ideias de Peter Higgs, François Englert e seus colegas seriam vingadas pela descoberta, feita pelos experimentos Atlas e CMS do LHC, completando assim o chamado Modelo Padrão da Física de Partículas —o arcabouço teórico que reúne todos os entes subatômicos que geram a matéria e as partículas portadoras de três das quatros forças conhecidas da natureza: a força nuclear forte, que mantém os núcleos atômicos coesos; a fraca, que produz certos decaimentos radioativos; e a eletromagnética— nada menos que a luz, responsável por fenômenos elétricos e magnéticos. Trata-se da teoria mais testada da história da ciência.

“O bóson de Higgs possuía todas as propriedades preditas pelo modelo, como spin, modos de decaimento, acoplamentos às demais partículas etc.”, diz Novaes. “Foi um sucesso fantástico que coroou a engenhosidade humana e sua capacidade de desvendar o funcionamento da natureza.”

Para Peter Higgs, contudo, o resultado foi agridoce. Embora emocionado e feliz de ver seu trabalho teórico finalmente coroado pelo escrutínio implacável da realidade física, o modesto e recluso cientista se incomodou com os holofotes que se projetaram sobre ele. Em entrevista à revista Scientific American, o pesquisador chegou a dizer que a descoberta do bóson “arruinou [sua] vida”. “Minha existência relativamente pacífica estava terminando. Meu estilo é trabalhar isoladamente e ocasionalmente ter uma ideia brilhante.”

A conquista do Nobel fez o cientista deixar sua casa na área urbana de Edimburgo para ir morar no campo, de onde nos deixou pacificamente nesta segunda-feira.



Fonte: Externa

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