Políticas de Estado perenes dependem do fortalecimento das instituições, da mobilização social, da capacidade de comunicação e de embasamento científico para obter resultados sólidos, avaliam especialistas presentes no painel “Desenvolvimento sustentável e o papel do Estado”, durante o terceiro dia do evento paralelo ao G20 “States of the Future”, no Rio.
“A durabilidade das medidas passa pela construção e pelo envolvimento social. Mesmo com o retrocesso que vivemos no governo passado, a situação poderia ter sido pior, não fosse a pressão e o engajamento popular de defesa das políticas. Por exemplo, por muito tempo se falou que o Bolsa Família acabaria com o passar dos anos, mas se manteve”, disse.
A ex-vice-presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), Thelma Krug, acrescentou que as políticas de Estado não são estáticas e destacou que a sua perenidade está relacionada ao embasamento em evidências.
“Precisamos ter comunicação sobre as razões pelas quais as políticas precisariam ser modificadas ou mantidas. O conhecimento e a ciência são fundamentais, é isso que vai levar o país para frente e alavancar todas as políticas em todos os setores”, afirmou Krug.
Também no evento, o secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), João Paulo Capobianco, enfatizou a importância das instituições para assegurar estabilidade política, econômica e ambiental.
“Precisamos fortalecer as instituições, e o nosso governo atual tem um compromisso radical nessa direção. Além disso, assegurar que o Estado democrático garanta a participação social na formulação de políticas públicas é outro eixo central que foi dilacerado alguns anos atrás”, pontuou Capobianco.
A líder global para Finanças Sustentáveis do Banco Mundial, Svetlana Klimenko, completou que a política pública deve ser viável e exequível, eixos nos quais o financiamento precisa entrar. Ainda de acordo com ela, a comunicação também é um ponto-chave. “A forma como você apresenta o que quer fazer vai definir o seu sucesso”.
Letícia Leobet, assessora internacional da Geledés, do Instituto da Mulher Negra, enfatizou ainda que é necessário haver investimentos que deem conta de um “estatuto da igualdade”, que teriam de ser orientados a políticas de Estado e não de governo.
Krug, Ex-IPPC, também observou que o combate à mudança climática é um imperativo e que demanda um esforço global. Segundo ela, em 2019, o IPCC anunciou que o mundo estava 1,1ºC de aquecimento acima do período pré-industrial e hoje esse número já subiu para 1,3ºC. Nesse ritmo, a meta do Acordo de Paris para prevenir o aquecimento da Terra em 1,5ºC está perto de ser superada.
“O duro é que esse aquecimento não se distribui uniformemente e você não para o aquecimento global do dia para a noite. Não adiante os países em desenvolvimento fazerem um esforço para redução se não são os maiores emissores históricos. Nós não somos grandes emissores pela nossa matriz elétrica, se conseguirmos segurar o desmatamento, o Brasil terá emissões muito pequenas”, destacou Krug.
Na mesma linha, Capobianco, do MMA, lembrou que o presidente Lula assumiu o compromisso público de alcançar o desmatamento zero até 2030 e que o governo está trabalhando para, ao menos, “deixar um legado até 2026” — ano em que o atual mandato presidencial se encerra.
Ele também destacou que é preciso criar uma plataforma para coibir o crime ambiental e mecanismos para fomentar uma agricultura mais sustentável. “O Plano Safra traz novas condições. Se você quer taxas de juro diferenciadas, tem que caminhar na direção da agricultura de baixo carbono, da agricultura regenerativa. Do contrário, pega o juro mais caro do plano safra convencional”.
O secretário-adjunto da Fazenda, Dubeux, acrescentou que é necessário mudar o modelo de desenvolvimento do Brasil. “Desde a chegada dos portugueses, o país tem um modelo extrativista, de destruição da natureza, com baixo valor agregado e com enormes e obscenas desigualdades ao longo de todo esse período”, disse.
Para ele, o país País precisa mover seus objetivos para um modelo que promova ganhos de produtividade, com estímulo à Ciência, Tecnologia e Inovação, a uma relação mais respeitosa com o meio ambiente e a um modelo de crescimento que não seja concentrador de renda, mas que promova ganhos de forma justa.
Em relação à mitigação de impactos climáticos, Svetlana Klimenko, do Banco Mundial, destacou que cada Estado precisa abordar o tema de maneira diferente. “Quando o assunto é sobre finanças, não há bala de prata. Você precisa olhar para o seu país e identificar as oportunidades para crescer e contribuir para as metas globais. Baseado nisso, você seleciona seus projetos”, comentou.
De acordo com Per Fredrik Pharo, diretor de Clima e Meio Ambiente da Agência Norueguesa de Cooperação para o Desenvolvimento (Norad), o que foi atrativo para a Noruega no modelo do Fundo Amazônia é o próprio desenho do fundo.
“O Brasil tem mostrado vontade de combater o desmatamento, o que começou no Lula 1 através de ações reguladores. Também foi feita uma regra que se o Brasil mostrasse os resultados do Fundo Amazônia, mais recursos seriam aportados. Há ainda o papel da tecnologia. Acho que a combinação de sensoriamento remoto e digitalização de processamento de dados criam oportunidades extraordinárias e o Brasil revolucionou isso”, disse Faro.
Ele completou que o interesse da Noruega em contribuir para o fundo começa pelo entendimento de que a natureza é um bem público. “Os bens públicos precisam ser valorizados por ações públicas e só Estados podem fazer isso, é uma questão tanto de soberania quanto de efetividade”.