Rodrigo Agostinho, diretor do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), diz que o presidente Lula (PT) publicará um decreto presidencial “nos próximos dias” sobre a necessidade de realizar o estudo chamado AAAS (Avaliação Ambiental de Área Sedimentar) em locais ambientalmente sensíveis para a exploração de petróleo, como a bacia Foz do Amazonas.
A AAAS, que é uma responsabilidade conjunta do MME (Ministério de Minas e Energia) e do MMA (Ministério do Meio Ambiente), avalia o impacto de toda a cadeia de combustíveis fósseis em uma área ambientalmente sensível.
No ano passado, o estudo esteve no centro do debate sobre a exploração de petróleo na margem equatorial, após o Ibama negar à Petrobras uma licença para pesquisar petróleo no bloco 59 da bacia Foz do Amazonas. No seu parecer, o órgão ambiental citou a ausência da AAAS como uma das razões para a negativa à estatal.
Embora a AAAS não seja um pré-requisito legal para autorizar uma perfuração no Brasil, ela “é um instrumento importante que mede a viabilidade ambiental de um projeto”, diz Agostinho. ‘’É um estudo que não olha exclusivamente para a área de perfuração. Ele avalia o conjunto.’’
A AAAS foi instituída no Brasil em uma portaria interministerial de 2012, segundo a qual esse tipo de estudo deveria ser apresentado para licenciamentos ambientais. A regra, porém, não virou prática no Brasil.
Ainda pela portaria, quem realiza este estudo é o Ministério de Minas e Energia em conjunto com o Ministério do Meio Ambiente.
O decreto a ser publicado por Lula se aplicará não apenas à Foz do Amazonas, diz Agostinho, e ajudará a “regulamentar as avaliações ambientais estratégicas para todo o Brasil”.
A Petrobras aposta na margem equatorial, região que estende pela costa norte do país, do Amapá ao Rio Grande do Norte, como a nova fronteira petrolífera. A empresa prevê investimento de mais de R$ 15 bilhões na região, quase metade de seu orçamento até 2028.
No início deste ano, a Petrobras perfurou seu primeiro poço exploratório na margem equatorial, próximo ao Rio Grande do Norte.
No ano passado, o licenciamento do bloco 59 —que está de 160 km a 179 km da costa do Amapá, na direção da cidade de Oiapoque— gerou tensão entre os setores ambiental e de energia do governo Lula. O decreto instituindo a necessidade de realização da AAAS pode, dessa forma, servir como um ponto de inflexão na disputa entre MME e MMA.
Em meio à crise entre as alas, a ministra Marina Silva reiterou que as decisões de licenciamento do Ibama são técnicas, não políticas.
“A Petrobras hoje é a principal cliente do Ibama”, reforça Agostinho. Embora, em muitos casos, o Ibama conceda as licenças à Petrobras, às vezes, por motivos técnicos, precisa negá-las, diz também. “Mas no ano passado a Petrobras ainda foi a campeã das licenças emitidas pelo próprio Ibama.”
Do outro lado, o MME, liderado pelo ministro Alexandre Silveira, e a Petrobras argumentam que o plano apresentado pela estatal é seguro e que o Brasil não deve ficar para trás na exploração da região, que já fez da Guiana uma potência petrolífera.
Depois que o Ibama negou a licença para o bloco 59, a Petrobras apresentou imediatamente um novo pedido para a mesma área na Foz do Amazonas. Enquanto o Ibama analisava a nova solicitação, tanto o MME quanto a Petrobras tentaram aumentar a pressão sobre o órgão ambiental no ano passado.
Em agosto, Silveira solicitou à AGU (Advocacia-Geral da União) um parecer jurídico sobre o caso. A AGU concluiu que a ausência de uma AAAS não poderia impedir a realização de licenciamentos.
Em reação à posição da AGU, Marina Silva afirmou, à época, que “o Ibama nunca disse que era [condicionante]”. “Disse que é uma ferramenta de planejamento que com certeza ajuda nos processos de licenciamento. Posso fazer com uma lente ampliada, olhando para os empreendimentos da bacia [da Foz do Amazonas]”, comentou também.
Em outubro, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, afirmou em evento no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) que espera poder perfurar a região em 2024. “Nós temos toda a expectativa legítima de, ainda no primeiro semestre do 2024, ou o mais tardar ao longo do ano, ir rumo ao Amapá para perfurar a margem equatorial.”
“Nós recebemos muita pressão de todos as formas, político, técnico, tudo”, diz Agostinho. “Uma decisão presidencial ajuda que todos tenham o mesmo entendimento”, avalia, sobre o decreto esperado para breve.
Questionado sobre o porquê de o decreto sair neste momento, Agostinho afirma que “as coisas levam um certo tempo de amadurecimento”. Para ele, a complexidade da região foi entendida pelo governo.
Lula, que defende a exploração da margem equatorial, tem a pauta ambiental como uma das principais bandeiras do Brasil na diplomacia. Nesta terça-feira (26), o presidente receberá o mandatário da França, Emmanuel Macron, em visita a Belém.